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Aprende. Habitua-te.

Iniciado por Hera, Outubro 22, 2016, 10:35:57

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Hera

(o manual de sobrevivência)

Aprende.
Que as coisas são ironicamente e apenas o que são: habitua-te.
Que as tuas opiniões valem ironicamente e apenas o que valem: habitua-te.
Que a tolerância não é uma maneira de viver; é a única maneira de viver: habitua-te.
Que é fundamental que nem tudo corra bem como é fundamental que nem tudo o que corre mal te faça mal: habitua-te.
Que não tens o direito de magoar só porque te magoaram: habitua-te.
Que a injustiça acontece quer tu queiras quer não queiras: habitua-te.
Que por vezes não tens de mudar nada em ti para tudo mudar em ti: habitua-te.
Que não tens sempre razão e que a razão não vale a ponta de um chavelho quando comparada com tudo o que ganhas quando não a tens: habitua-te.
Que pode haver algo maior do que amor nesta vida mas se houver ainda não foi descoberto: habitua-te.
Que a saudade não serve para magoar; serve para continuar a amar: habitua-te.
Que o medo não serve para parar; serve para trazer a coragem de continuar a andar: habitua-te.
Que se não rires pelo menos mil vezes por dia não andas aqui a fazer rigorosamente nada: habitua-te.
Que se não deres pelo menos mil beijos e abraços e apalpões e coisas estupidamente assim por dia não andas aqui a fazer rigorosamente nada: habitua-te.
Que a perda existe, é uma bosta e dói como se a vida acabasse e talvez até acabe mesmo, mas tens de aguentar custe o custar: habitua-te.
Que se fores sempre pessimista um dia vais estar certo e que se fores sempre optimista um dia vais estar certo; a decisão é tua: habitua-te.
Que a filosofia é um monte de tretas mas que pode aqui e ali fazer falta para conseguires explicar o que na verdade não tem explicação: habitua-te.
Que estas palavras servem para exactamente nada e tudo o que eu escrevi nelas tu já sabias, mas se calhar precisavas de as ler ou talvez não, mas de qualquer forma aqui estão elas: habitua-te.
Que há dias em que é importante ser absolutamente inconsequente e não pensar em mais do que o minuto do que é agora e desprezar o minuto do que eventualmente será a seguir: habitua-te.
Que ser sincero não quer dizer necessariamente ferir o outro só porque queres ser sincero e é giro e tal ser sincero: habitua-te.
Que a liberdade não quer dizer poder ofender gratuitamente: habitua-te.
Que forte não quer dizer indestrutível; forte quer dizer resistente: habitua-te.
Que o trabalho não enobrece mas também não deixa de enobrecer: habitua-te.
Que a dignidade é algo que não depende do que os outros vêem em ti: habitua-te.
Que o prazer existe e ai de ti se não o procurares como um louco: habitua-te.
Que isto podem ser balelas mas também podem não ser; mais uma vez a decisão é tua: habitua-te.
Que tu não duras para sempre, que a tua mulher ou o teu marido não duram para sempre, que o teu pai ou a tua mãe não duram para sempre, que a tua irmã ou o teu irmão não duram para sempre, que os teus amigos não duram para sempre, que nada nesta coisa desta vida dura para sempre: habitua-te.
Que nem o que é mau dura para sempre: habitua-te.
Que és diferente, que pensas diferente, que fazes diferente, como toda a gente pensa diferente, faz diferente e é diferente, e ainda bem porque é isso que faz a diferença: habitua-te.
Que já não devias estar a ler estas palavras e devias era estar a fazer o que estas palavras te exigem que faças: habitua-te.
Que eu vou também daqui para fora, que já perdi tempo demais a escrever isto quando devia estar a fazer isto: já me habituei.
Habitua-te tu também.

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in "Prometo Perder", o meu novíssimo livro
Pedro Chagas Freitas